#6 Quão livre é o comércio internacional?

O comércio internacional parece ser um tema longínquo, opaco, inacessível e irrelevante para a nossa vida e para o planeta. E, no entanto, nada mais errado. Em cada compra que fazemos, seja no supermercado, numa loja de roupa ou de aparelhos electrónicos, estamos – a maior parte das vezes sem nos apercebermos – a ser atores e atrizes nesse palco que é o do comércio internacional.Como consumidores/as, só estamos atentos/as aos preços e à variedade de produtos disponíveis.

João Vasco Gama explicita as diferentes variáveis em jogo nesse palco, entre elas as famigeradas taxas aduaneiras que tentámos descortinar. Mas, como nos explica Luís Mah, essas variáveis têm uma história e, atualmente, elas dependem, em vasta medida, do comércio internacional liberalizado.

Os tratores nas manifestações de agricultores/as contra o acordo UE-Mercosul que ocorreram em vários países europeus, em finais de 2024, foram a expressão mais visível de conflitos entre preços mais baixos por um lado e padrões ambientais e de bem-estar animal mais elevados por outro, assim como diferenças de escala, como nos contam Bettina Müller e Víctor Rodrigues.

Os pilares desse palco global são os acordos de liberalização do comércio e investimento: tratados de centenas de páginas que dois ou mais países negoceiam e implementam. No texto de Luciana Ghiotto percebemos que tais acordos não se limitam a eliminar ou reduzir tarifas: eles visam “harmonizar”, ou seja, uniformizar os padrões ambientais, sociais, laborais, de direitos humanos, de saúde, bem-estar animal, etc. Tais padrões tendem a ser considerados “barreiras ao comércio” e a ser alinhados pelo nível mais baixo. Um dos mecanismos mais perniciosos destes acordos tem a ver não com comércio, mas com Direito: o chamado ISDS ou Resolução de Litígios entre Investidores e Estado, de que nos fala a TROCA.

São múltiplos os acordos de comércio livre a nível europeu e mundial. Ficamos com uma ideia dessa “manta” de liberalização comercial através dos mapas elaborados pela TROCA. Mas esses acordos assinados pelos Estados entram, muitas vezes, em contradição com os compromissos que os mesmos assumem, a nível ambiental e da solidariedade internacional. Podemos perceber melhor estas incoerências ouvindo o podcast com Patrícia Fonseca e Susana Fonseca.

Este número tenta, assim, dirigir um foco de luz para as múltiplas vertentes de tais acordos, que, desde 2009, com o chamado Tratado de Lisboa, passaram a ser negociados diretamente pela Comissão Europeia, aprovados pelo Parlamento Europeu e, em princípio, ratificados pelos parlamentos nacionais dos 27 Estados-Membros. Mas trazer também alguma luz de esperança!

Desde os movimentos de camponeses/as em Portugal, ao Equador, passando por plataformas cidadãs, é possível lutar contra os vários mecanismos de injustiça no comércio internacional, desde os acordos de comércio livre à ação desregulada das empresas multinacionais. O percurso contra o Tratado da Carta da Energia realizado pela TROCA e outras organizações nacionais e europeias é um exemplo da persistência e êxito! O movimento de Comércio Justo internacional mostra, desde os anos 60, que é possível criar, de forma concreta, modelos éticos e equitativos de trocas entre pessoas e países.

A par do Comércio Justo são múltiplas as iniciativas sócio-económicas, em Portugal, que procuram construir uma outra economia, e que pode descobrir na secção “Alternativas Económicas”.

Valores como os direitos humanos, empregos dignos ou a soberania alimentar são os objetivos superiores a atingir. O articulado dos acordos de comércio internacional que alicerçam a globalização terão de ser transversalmente direcionados para alcançar esses objetivos, com regras que consubstanciem uma política comercial benéfica para o ambiente e o clima, que proporcione empregos dignos e apoie a saúde e o bem-estar de todas as pessoas.

À semelhança dos números anteriores, convidamos educadores e educadoras a explorarem os temas desta edição através de duas propostas pedagógicas.

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Em colaboração com

#6 Quão livre é o comércio internacional?

Conselho Editorial:  CIDAC (Cecília Fonseca, Cristina Cruz, Maria Fera, Stéphane Laurent); Plataforma TROCA (Conceição Alpiarça, Eduardo Proença, Marta Guedes)

Contribuíram para este número:

Artigos: Ana Moreno, CIDAC, Eduardo Proença, Filipe Marques, João Vasco Gama, Juliana Rodrigues de Senna, Luciana Ghiotto, Luís Mah, Vítor Rodrigues

Ilustrações: Inês Mendes   Guião: TROCA

Podcast com: Ana Patrícia Fonseca e Susana Fonseca. Edição: CIDAC

Vídeos com: Ana Rita Raleira, Bettina Müller, Benjamín Macas e Francisco Venes. Edição: CIDAC

Traduções: CIDAC e Francisco Venes

Conceção gráfica: Carlos Guerreiro

Paginação: CIDAC