Capitalismo português e (neo)colonialismo

Nesta secção propomos dois contributos da África em Luta, uma publicação periódica editada pelo CIDAC (na altura Centro de Informação e Documentação Anti-Colonial) entre 1975 e 76, com foco na descolonização e informação económica e política dos PALOP, no pós-independências. Em pleno processo de democratização em Portugal e de descolonização em África, esta publicação prosseguia os objetivos do anterior Boletim Anti-Colonial – iniciado clandestinamente em 1972 com a vontade de servir a luta anti-colonial e de se solidarizar com os movimentos de libertação africanos.

 

No editorial do primeiro número, de fevereiro 1975, afirma-se a importância de se continuar a debruçar sobre os países até aí ocupados, apesar das necessidades do processo revolucionário em curso e do novo contexto em Portugal. Isto, porque: “a luta pela independência completa dos povos colonizados não se pode separar do nosso processo revolucionário: é a mesma classe dominante, a burguesia portuguesa, que procura consolidar em Portugal o capitalismo e em África o neo-colonialismo”.

 

Por ocasião dos 50 anos do CIDAC (hoje, Centro de Intervenção para o Desenvolvimento Amílcar Cabral), num contexto político, económico e social muito diferente, achamos relevante reler alguns excertos desta publicação. Em particular de duas reflexões que evidenciam as relações entre o sistema económico português, entendido como fruto de um processo de acumulação primitiva capitalista, e as possíveis (e nascentes) formas de neo-colonialismo nos territórios africanos.

O texto “Capitalismo português e neocolonalismo“, do economista e professor português Eduardo Sousa Ferreira, apresenta-se como análise e denúncia dos riscos e desafios que os povos africanos irão enfrentar ao pôr em cheque o status quo colonialista português e ao tomarem posições radicalmente anti-imperialistas, que iam além da independência política. Destaca a relação entre o processo de renovação e mudança do capitalismo português pós-independências e as estratégias neo-coloniais que ameaçavam um continente em processo de libertação do velho poder colonial e em fase de questionamento do modelo económico dominante.

 

Em “O peso da herança colonial“, a redação dialoga com outro economista português, Manuel Alves, na altura a trabalhar em Moçambique. Aqui, a análise foca-se no caso específico da economia moçambicana, nas formas de interdependência entre as economias dos dois países e em alguns exemplos concretos sobre os desafios e as dificuldades inerentes ao processo de libertação, não apenas político, mas também económico. Isto é, sobre o peso da herança colonial, tanto ideológica quanto organizacional e materialmente.